sábado, 12 de julho de 2014

[Utter] Capítulo 02 - Parabéns, Gugu!

Quase um mês de novo ano e eu não tinha visto muito o Gugu. Quando eu podia, ele não podia e quando eu não podia, ele podia. Era 31 de Janeiro, aniversário dele.
Olhei para o relógio. Gustavo ia me matar, estava mais que atrasada para o aniversário dele. Retoquei a maquiagem e ajeitei o corselete rosa com detalhes em prata. A calça jeans azul claro estava do jeito que o Gugu gosta: apertada e tinha uns rasgos bonitinhos.
Afivelei a sandália preta e aberta de salto. Me olhei no espelho grande. Depois de aprovar o look e dar uma arrumada nos cachos que fiz na babyliss e sorri. A maquiagem realçava a cor esverdeada dos meus olhos e não parecia que eu estava usando, bem discreta.
Lembrei do gostoso da festa de ano novo. Será que ele estaria lá? Bom, espero que não já que vou ficar de pegas com o Gugu.
Mas porque mesmo que tô ligando para isso? Não é como se eu fosse dar moral para aquele folgado! Nenhum moleque chega em mim que nem ele e vive para contar história!
Saí do meu quarto e vi meus pais fingindo que são a família mais feliz do mundo, enquanto meu irmão era repreendido por algo que não faço ideia.
– Mas que linda, filha! – Meu pai elogiou e eu girei. Ainda não engoli essa história de fazer ADM sem querer.
– Valeu, pai. Não sei se volto pra dormir, mãe. – Avisei logo antes que ela decidisse bombardear meu celular no meio da festinha entre quatro paredes.
– Pois pode voltar! – Meu pai exclamou da cadeira dele e eu arqueei uma sobrancelha dele. Que merda a família dele tinha feito? Sim, a outra que eu sei que ele deve ter, porque ele nunca ligava e agora…
– O quê? – Resolvi perguntar. Meu pai fechou o notebook e me olhou, cruzando os dedos.
– Disse que é para voltar sim. E antes de uma da manhã, entendeu? – Bufei, ele tomou isso como um sim muito do contrariado e abriu o maldito notebook de novo.
Peguei minhas chaves, meu celular e saí do apartamento dos meus pais, indo para minha vaga na garagem, pegar meu carro. Liguei o carro e dirigi para lapa.
[…]
Estacionei na frente da garagem do Gugu. Tirei a chave da ignição e peguei a bolsinha no banco do passageiro. Desci e entrei na casa de dois andares do tio dele.
Gustavo era do interior do Rio, morava aqui com o tio na marra porque estava doido para morar sozinho.
Eu sabia disso porque era sempre nós dois falando de decoração e vendo apartamentos como um suposto casal.
Entrei na casa e vi logo ele vir me cumprimentar. Sorri quando ele checou meu visual e girei, quando ele chegou perto o suficiente para ver os detalhes.
– Gostou?
– Você demorou, sua sacana!
– Estava me arrumando. – Fiz um bico e vi ele olhar para a minha boca e depois para o meu rosto. – Não ficou feliz? – Perguntei fazendo charme, ele suspirou. Parecia estranho.
– É… claro! – Sorri mais feliz que ele reconheceu o que eu já sabia e dei um selinho nele. Hoje eu ia ceder bem facinho só porque era aniversário dele.
Uma mina chegou me encarando feio e olhei para trás, quando vi que só tinha a porta atrás de mim saquei que era mesmo eu.
– Oi! Quem é ela, Guguzito? – Ela sorriu, mas foi frio. Retribuí com meu melhor sorriso sarcástico.
Guguzito? Quantos anos essa ninfetinha tem? Doze? É, acho que dancei nessa. Perdi a minha foda semanal.
– Sou Patrícia. A…
– Minha melhor amiga. Estudamos juntos. – Levantei uma sobrancelha para ele. Tá, entendi. Realmente ele tá criando essa criatura.
A guria tinha irritantes cabelos louros e olhos castanhos, até que era bonita. O corpo todo no lugar, mas trocar euzinha por isso? É quase uma ofensa!
E ainda por cima tinha que ser uma ninfeta com cara de criança? Me trocar por isso é sacanagem.
– Ai, você me desculpa viu… Qual seu nome, anjinho? – Perguntei mais fria do que gelo. Eu senti meu tom e não estava a fim de ser amigável.
– Clara, querida. – É, a pirralha da perereca de fogo me respondeu no mesmo tom.
– Ok, Clara. Nós sempre nos tratamos assim. Não sabia que ele estava de babá hoje ou jamais teria dado uma bitoca nele.
– Babá porque? Só porque não sou uma anciã? – Mordi a língua para não descer a porrada na guria. Quem ela acha que é?
– Babá porque trocar fraudas de uma loura oxigenada não é exatamente o que ele gosta de fazer, se é que me entende.
Ela inflou e ele me fuzilou. Levantei os ombros como quem diz “Ela mereceu.” e a pirralha oxigenada saiu furiosa, casa adentro e ele seguiu irritadiço, atrás, e claro, não sem antes me dar um olhar que dizia que a gente ia conversar.
Caminhei para a mesa e peguei um copo. Bebi a gelatina alcoólica de framboesa e peguei mais uma, indo para a varanda do primeiro andar.
Abri a porta e senti o vento no meu rosto. Era gostosa a sensação do vento passando pelo meu rosto em fogo. A discussão de lá em baixo estava me mantendo quente, enfurecida.
Soltei as portas e fui para a varanda, definitivamente. Me escorei na grade e fechei os olhos, sentindo o vento balançar meu cabelo.
Droga! Perdi minha foda de sempre. Agora ia ter que ficar pulando de galho em galho de novo.
Suspirei. Não acredito ainda que a culpa é de uma guria tão sem sal. Senti um cheiro conhecido e duas mãos na minha cintura.
Olhei o sem noção e lá vinha aquele gostoso de novo. E cara, que saudades! Eu nem sei porque, mas parecia que eu estava esperando encontra-lo aqui hoje.
Eu podia transar com ele hoje.
Não ia ser perda de tempo. Ele era bonito. Tinha os olhos mais lindos que eu já vi. Não eram pretos, todo mundo diria que eram, mas eu conseguia ver que eram castanhos, bem escuros.
Ele sorria com eles.
Mordi a boca e senti isso pouco tempo depois. Ele passou o dedo na minha boca e desprendeu a carne dos meus lábios.
– Não. – A respiração faltou, ele tinha mãos com calos. Eu senti eles enquanto ele segurou com as duas mãos, o meu rosto.
Acabei fechando os olhos, meu coração batia forte e eu não conseguia pensar enquanto ele assoprou a minha boca. Senti aquele cheiro de menta de novo e a boca dele se sobrepôs a minha.
Não era gentil. Era exigente, duro e eu queria mais. Ele me colocou na grade da varanda e eu o empurrei levemente.
Não queria que se afastasse, mas tinha que me impor.
– Não cara, não gosto disso. – Ele arqueou a sobrancelha bem feita e castanha, segurei um suspiro. Ele estava puro charme.
– De beijar? – Girei os olhos. Ele estava brincando comigo. Com meus sentidos.
– Não. – Ele riu, sabia que ele tinha entendido. – Não pode chegar aqui e tentar me pegar. Não sou assim, cara. Desencosta. – O empurrei mais. Ia acabar caindo nas graças desse cara lindo e não queria fazer isso.
Mentirosa! Minha mente gritou. E eu quase suspirei de frustração quando ele realmente se afastou.
Era para insistir, palhaço!
Senti falta da calor e do cheiro dele. Ele era cheiroso demais. Ele continuava sorrindo e eu aqui, pendurada no parapeito da varanda querendo voltar e dar uns beijos nele.
– Faz tempo.
Tentei lembrar do ano novo. Tá, ele te beijou, você beijou de volta e não, não transei com ele. Pelo menos a única coisa que eu lembro é do Gugu me pegando na areia e a gente se arranhando. Depois só lembro de acordar no outro dia com a sensação de ter temperado a minha vagina com areia.
– Faz. – Comentei, simplesmente.
Não queria admitir que tinha sentido falta dele. Eu sei que tinha sentido, e muita! E isso era irracional. Ele era só muito gostoso, lindo, desejável, cheiroso…
Decidi deixar de parecer uma retardada virgem que conhece o primeiro cara gostoso e desci do parapeito. Passei por ele e fui descendo. Pra mim, essa festa já deu.
Fui no Gustavo me despedir, não ia deixar ele achando que tinha perdido o aniversário, de qualquer forma.
– Mas, já? – Ele perguntou e parecia que sentia muito. Bom… a namorada dele não parecia sentir tanto.
– Pois é, cansada. – Menti.
– Vai pra Macainá? Ouvi dizer que as festinhas de carnaval de lá vão ser da hora.
– Vou sim. A gente vai com o Samuca e a Cris.
– Beleza, a gente se vê então na Calisto amanhã a noite? O João falou que vai ter luau lá.
– Tá, vou ver o que consigo com meu pai.
Ele fez uma cara de que sabia que não ia ser fácil eu sair de novo. Agora meu pai encasquetou de querer me controlar. Até parece que eu sou a chapada da família.
Tirei meu cigarro de dentro da bolsinha e o acendi. Traguei e senti alguns dos meus músculos relaxando. Caminhei para fora sem pressa, as sandálias incomodando um pouco. Ia tirar assim que entrasse no carro.
Nenhum dos caras reparou em mim, estranho.
E foi aí que eu vi ele de novo. A pose igual a do dia que conheci ele, encostado no meu carro – ele não devia saber que era meu, o carro parecia de homem –, os braços cruzados e eu soube que ele malhava um pouco, uma perna esticada e a outra dobrada apoiando o corpo – que parecia uma delícia dentro do jeans e da blusa cinza.
– Já vai, Pat? – Me perguntei como diabos ele lembrava do meu nome.
Não me importei tanto assim, só fez meu coração acelerar. Metade dos caras com quem eu fico não lembra meu nome ao fim do primeiro beijo, que dirá depois do primeiro fora.
Não foi o primeiro fora que dei nele.
E ele ainda lembra do meu nome.
– Quer carona? Ou também não gosta disso? – Ele riu, estava fumando.
Era o mesmo cigarro que o meu, o blackdevil chocolate e baunilha. Estranho. Ninguém fuma esse cigarro. Encarei o cigarro e depois ele de novo. Apertei o controle do meu carro, ele riu e desencostou. 
– Gosta de uma tragada, Pat?
– De vez em quando. – Ou quando meu pai tá em casa, mas não ia dizer isso. Fumo para desestressar, e ninguém precisa ficar sabendo disso.
– Vai para casa? – Ele perguntou jogando a bituca do cigarro fora.
– Você vai? – De jeito nenhum que eu estava dizendo onde ia para esse daqui. Me leva!!! Me leva que eu vou onde você quiser!
– Não. Vou para o Barão. Tá cedo pra dormir. – Ele riu enquanto eu aquiescia. Estava cedo mesmo, mas meu pai foi categórico ao me lembrar de chegar antes da uma da manhã. – Desculpa a pergunta, mas quantos anos você tem?
– Dezenove. Faço vinte em Abril.
– Hum… Áries? – Olhei para ele. Que homem sabe os signos? Será que ele… não, ele é muito charmoso para ser bissexual. Não é como se eles conseguissem esconder muito bem como são.
– É de abril também?
– Minha mãe é. Sou de novembro.
Hum, sagitário. Meu céu em signo. Mordi o lábio inferior não querendo ir para casa.
– Quer vir comigo?
– Ih, nem dá. Outra parada. – Chamada pai muito, muito bravo em casa. Mas é claro que eu não ia dizer isso.
– Tá. Pena, na verdade. – Ele aceitou de primeira. Como assim? Era para insistir!!!
– Ok, tchau! – Joguei o cigarro fora, entrei no carro e ele bateu no vidro. Baixei as janelas e comecei a tirar as sandálias, meio abaixada.
Eu sentei de novo e olhei para a janela. E lá veio ele, aqueles olhos perfurando o meu rosto e eu senti a boca dele, quente, molhada, com gosto de cafeína doce contra a minha boca. Fechei os olhos e senti a língua dele aqui na minha, enrolando e explorando e assim como começou, terminou. Foi o melhor beijo roubado da história dos beijos roubados.
Ele piscou e se afastou. Era a minha deixa. Tinha que ir embora, não tinha desculpa. Liguei o carro e a hora no painel fez meu coração martelar no peito. Ia ter castigo, já era 1:33 da madrugada.
Droga, meu pai vai me matar! E eu não entendo muito bem o motivo, mas não estava ligando tanto assim.
Saí da garagem e fui calminha. Não ia acelerar para chegar mais rápido. Vi um cara numa moto atrás do meu carro, dei passagem, o lesado não passou. Então que mofe atrás do meu possante!
Estacionei na frente do meu AP. Não tinha problema deixar aqui e desci com as sandálias na mão esquerda, a chave na mão da direita. Ouvi uma buzina. Olhei e vi eletirando o capacete.
– Tá entregue, princesa.
Fiquei fula. Era eu sabendo que tinha que entrar e ele indo piranhar no Barão. Cogitei ir. Era isso. Eu ia lá.
E não, eu não sei porque é importante, mas esse carinha está me tirando o sono e eu não recuso uma boa aventura.
Apertei o controle, pronta para entrar no meu Citroen e meu celular toca no bolso da calça. Olhei o visor e bufei. Olhei para cima e meu pai deu um “alô” com cara de quem manda você entrar e se eu fosse mais inteligente, não teria olhado e nem atendido.
Pena que eu não sou.
Foi por isso que entrei no carro e dei a ré. Ele disse que ia para a Barão, eu vou também então!
O celular vibrou, ouvi o toque no silencio do carro e olhei de relance. A foto da minha prima reluzindo e sabia que era sério, ela não ficava me ligando de noite para conversar besteira.
Parei o carro no quadradão e atendi o celular, suspirando. Queria ir logo para lá e ficar com o lindo do Leonardo.
─ Fala prima.
─ Terminamos. – Droga! De novo não!
─ Dessa vez é para sempre? – Perguntei só para ter certeza e ouvi ela fungar do outro lado.
─ Acho que sim. Vem para cá? Por favor!
Segurei a bufada e concordei. Nenhum cara vale minha amizade com a Cristina. Somos quase como irmãs.
Eu tenho um irmão mais novo, mas é com ela que eu conto quando preciso e agora ela precisa de mim.
Voltei a repetir na minha mente “Nenhum cara vale a minha amizade com a Cris” e isso valia até mesmo para aquele monte de gostosura que era o tal do Leonardo.
Entrei na via de novo e dirigi para a casa da Cris, no final da avenida Zelos.

Continua

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